Quarto de Brinquedo

O quarto ficou em silêncio novamente. Aparentemente nada se movia. Aparentemente. A bonequinha de porcelana que descansava sobre a prateleira abriu os olhos e rodopiou, fazendo sua saia esvoaçar.
A luz da lua que vinha pela janela iluminava o pequeno quarto de menina, dando vida a seres que até pouco tempo atrás era inanimado. O patinho de borracha deu um suspiro. O soldadinho começou a marchar à procura de sua bailarina e, aos poucos, um mundo mágico foi surgindo.
A bonequinha de porcelana se aproximou do pingüim de pelúcia para comentar as peripécias da noite anterior:
- É Billy, tenho que admitir que o jeito que vocês tiraram o Duck da banheira antes de ele se afogar foi muito inteligente!
- Pois é... Eu nunca imaginei que teria que salvar um patinho de borracha da banheira!
- É... Nem eu!
- Amy, Billy! Ainda bem que encontrei vocês dois!
- O que aconteceu, Teddy? - indagou a boneca intrigada.
- Vocês não viram que a Mary ganhou um brinquedo novo?
- Não, não vi... Onde ele está? Teddy? O que você tem?
O urso de pelúcia ficou imóvel. Sua expressão era de extremo pavor. Não pronunciou mais nenhuma palavra e caiu como um tijolo no chão.
Uma risada estridente se fez ouvir, vinda de um canto escuro no quarto. De lá, surgiu uma bruxa, com suas longas vestes negras e um olhar penetrante.
- Quem... Quem é... Quem é você? - Amy tentava controlar seu medo.
- Eu, queridinha, sou quem vai ditar as regras a partir de agora. Se você quiser continuar com essa sua vivacidade, é bom me obedecer!
Amy olhou à sua volta. Não havia se dado conta do caos que se instalara no quarto. A bailarina chorava ao lado de seu soldado imóvel. O pato de borracha não suspirava mais. O rádio à pilha cessara seu canto. Tudo estava ficando fora de controle. Foi quando ela soube que teria que fazer alguma coisa. Agarrou-se à cortina e desceu até o telhado da casa de bonecas, enquanto Billy chamava a atenção da bruxa para ele. Antes de entrar pela chaminé, Amy viu o corpo inerte de seu amigo chegando ao chão.
Ao entrar no quarto da casinha, encontrou o que desejava: um espelho. Pegou o objeto e o arrastou até a porta da casa. Trocou algumas palavras com a bailarina, que se pôs a cantar. A bruxa, irritada com o som, aproximou-se dela, no exato momento em que a aranha de plástico tecia sua teia em volta dela, deixando-a imobilizada. A bruxa, desesperada, começou a gritar.
- Está vendo o que sua maldade fez com os outros? - Amy se aproximou.
- Me tira daqui, sua peste!
Amy colocou o espelho diante da bruxa.
- O que você vê? - perguntou a boneca.
- Eu... Eu me vejo!
- Sim! E o que você é?
- Sou uma bruxa!
- De quê?
- De... De... De brinquedo! Eu... Sou... De brinquedo!
- Sim! Como todos nós!
- É... Eu... Acho que sim! Eu fiquei tão cega com o poder que me deram, que esqueci minhas origens. Esqueci que sou... Como vocês! No fundo eu não sou má, sabe? Me fizeram assim.
- Ainda dá tempo de você reparar o seu erro! Traga os outros brinquedos de volta!
E a bruxa assim o fez. O patinho voltou a suspirar, o soldado voltou a marchar e o rádio voltou a cantar e assim continuaram até a menina entrar no quarto, acender o abajur e dormir.